O casamento misto é um dos temas mais discutidos da vida judaica. Afinal, por que os judeus devem se casar entre si? Em nosso mundo moderno e multicultural, por que inabilitar alguém como potencial parceiro (a) de casamento apenas porque ele ou ela não nasceu de um útero judaico ou não passou por um processo de conversão adequado?

Por um lado, é fato que muitos pais, em geral, apesar de não serem observantes dos preceitos religiosos, sentem que, quando seu (sua) filho (a) se casa com uma pessoa não-judia, ele ou ela está rompendo a cadeia milenar de continuidade judaica e não querem que isso aconteça.

Por outro lado, os mesmos pais se sentem, às vezes, pouco à vontade de se oporem abertamente ao casamento misto por causa de sua aparente conotação discriminatória.

Para analisarmos mais a fundo esse assunto, precisamos primeiro entender qual é o fundamento para a objeção a casamentos mistos.

A fonte primária sobre a qual se baseia a proibição de um judeu casar com um não-judeu encontra-se na Torá (Deut. 7:3): “Não casarás com eles (com os não-judeus, sobre quem a Torá fala nos versículos anteriores), não darás tua filha ao filho deles e não tomarás a filha deles para teu filho…”.

Ou seja, o casamento misto é uma clara contradição à vontade declarada de D-us na Torá.

O motivo para essa proibição está explícito no versículo a seguir: “Porque ele afastará teu filho de Mim e eles servirão a deuses estranhos…”.

A implicação direta é que filhos desse tipo de união serão afastados dos preceitos judaicos, que representam a vontade mais profunda de D´us.

Essa também é a fonte bíblica para a lei de descendência materna. Como o versículo declara “pois ele (isto é, um pai não-judeu) fará teu filho se afastar…”.

Filho nascido de uma mãe judia é judeu

Isso quer dizer que um filho nascido de uma mãe judia é judeu, ao passo que se um homem judeu se casa com uma mulher não-judia, o filho não é judeu.

Assim, no caso de uma mãe não-judia, o filho não é judeu, e uma linhagem judaica ininterrupta até então foi rompida.

Se um homem não-judeu se casa com uma judia, os filhos são judeus. No entanto, a Torá proíbe explicitamente esse tipo de união, pois “ele desviará teu filho”.

Isso deixa claro que a proibição de casamentos mistos não está relacionada à discriminação racial. Estamos falando sobre uma ordem Divina objetiva, que é acompanhada por uma explicação.

Compatibilidade de almas

Há almas que são compatíveis para casamento e há almas que não são. Além do caso de casamentos mistos, a Torá enumera uma lista de “casamentos” ilícitos.

Por exemplo, o “casamento” entre irmãos biológicos ou entre um homem e uma mulher que ainda esteja casada legalmente com outro homem. Situações similares a estas constituem algumas das violações de incesto ou adultério. Nesses casos, jamais pode haver qualquer casamento, embora seja fisicamente possível coabitar e procriar.

Da mesma forma, não somente é proibido para um judeu se casar com uma não-judia, é impossível para um judeu desposar religiosamente uma não-judia. É possível para eles viverem juntos, coabitarem, até mesmo, procriarem. Mas não há possibilidade de ocorrer o casamento conforme a Torá.

Isso porque o Talmud e a Cabalá nos ensinam que o casamento não é apenas uma união entre dois indivíduos. É a reunião de duas metades compatíveis.

Um casal compartilha a mesma alma que, no nascimento, se divide em duas metades incompletas. Com o casamento, elas se reúnem e se tornam, mais uma vez, completas.

Com base nisso, explica-se porque não se considera o não-judeu um potencial parceiro de casamento. Não é devido a um defeito que ele ou ela tenha. Deve-se simplesmente ao conceito bíblico do casamento, ao qual todo judeu sente-se obrigado a aderir. Tal qual uma irmã de sangue que, apesar de saída do mesmo ventre, não estaria apta para ser sua esposa.

A essência de cada um 

É possível que um rapaz judeu encontre compatibilidade com uma moça não-judia (e vice-versa) e deseje formar uma família com ela. Essa aparente compatibilidade somente é possível quando nenhum deles manifesta sua essência.

Desde que o judeu não se preocupe com o fato de ele ou ela ser judeu e o não-judeu não se preocupe com sua origem pessoal e sua essência, tudo parece perfeito.

O que acontecerá no dia em que qualquer um deles “acordar” e decidir preocupar-se com aquilo que realmente é? De repente, surge a incompatibilidade!

Em outras palavras, enquanto nenhum dos dois se preocupa com sua essência, eles podem sentir-se compatíveis com alguém que é essencialmente oposto. No minuto em que um deles descobre sua verdadeira identidade, o relacionamento transforma-se em questionamento.

O Rei Salomão declara: “Estou dormindo, mas meu coração está desperto”. Um judeu pode estar dormindo espiritualmente. No entanto, no íntimo, seu coração judaico está sempre alerta e, a certa altura, será despertado.

Após anos dentro de um casamento, em que grande parte das ações se transformam em rotina, a alma e o coração judaicos podem ser despertados para procurar o significado mais profundo da vida. Pode haver uma busca pela espiritualidade e redescobrimento das próprias raízes.

O lado prático do casamento 

Vamos considerar alguns dos problemas práticos que surgem nos casamentos mistos. Analise as seguintes questões com atenção: quem celebrará a cerimônia? Esta será em uma igreja ou sinagoga? Em que tipo de bairro o casal irá morar e criar os filhos? Que símbolos religiosos haverá na casa? Haverá uma mezuzá à porta ou outro símbolo?

O casal frequentará quais celebrações? No futuro, haverá pressão para que o cônjuge se converta?

O cônjuge judeu vai querer ser enterrado em cemitério judaico? O casal desejará ser enterrado junto? Que práticas de luto eles desejarão que sejam observadas em sua memória?

E quando os filhos nascerem? Os problemas mais conhecidos dos casamentos mistos dizem respeito a eles.

Em muitos casos, o cônjuge não judeu pode ser convencido a permitir que um bebê do sexo masculino seja circuncidado. Haverá batizado? Que tipo de escola as crianças frequentarão? Elas serão educadas em uma religião, nas duas ou em nenhuma? Os filhos saberão ler hebraico?

A família comemorará Chanucá e/ou Natal? E quanto às outras festas? Haverá bar / bat mitsvá? E se as crianças começarem a gostar mais de uma tradição do que da outra?

Por fim, como será a reação do casal se os sentimentos de um dos cônjuges mudar com relação a essas questões fundamentais, como acontece de forma costumeira?

Todas essas possíveis dúvidas refletem problemas comuns nos casamentos mistos. São questões que não parecem problemáticas até “explodirem” no casamento mais tarde.

Um edifício duradouro 

Um casamento judaico é chamado de Binyan Adei Ad – um edifício duradouro. Para que isso ocorra, tudo deve estar conectado com as instruções da Torá, que é a fonte da vida, bem como um verdadeiro manual que ensina como devemos viver.

É claro que o amor é essencial no casamento. Uma união sem amor é estéril e instável. Porém, muito mais é necessário.

Como escreveu o rabino Jacob J. Hecht, de abençoada memória, “o matrimônio representa uma ligação, uma busca de continuidade social e segurança familiar, uma preocupação com o passado e esperança para o futuro. Essa ligação deve firmar-se não só no amor, mas também em propósitos comuns e objetivos ideais compartilhados. O casamento entre duas pessoas educadas em fés diferentes priva essa ligação de grande parte de suas afinidades”.

É como pensar na construção de uma casa. Sem uma fundação sólida, todos os esforços colocados nas paredes, no teto e na decoração serão inúteis. Isso é ainda mais verdadeiro sobre a estrutura do casamento: se os alicerces são instáveis, acaba ocorrendo um desmoronamento.

Por isso, um casamento judaico deve, antes de mais nada, ser baseado na Torá: nossa fundação sólida!

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